A UNE deve respeitar o STF?

Em entrevista recente de uma página inteira ao jornal O Estado de São Paulo publicada no dia 06/11 sobre o Mensalão e o julgamento de Zé Dirceu, o Presidente da UNE, Daniel Iliescu, em meio a observações justas e outras discutíveis, deu uma declaração que somos obrigados a discordar radicalmente. Ao ser indagado se a UNE questiona ou não a decisão de condenação de Dirceu pelo STF, ele deu a seguinte resposta: “Quem tem competência para condenar ou julgar é o STF e a UNE reconhece esse poder e tem a responsabilidade de respeitar as instituições democráticas”.

Assim, caberia à UNE “a responsabilidade de respeitar as instituições democráticas”. Mas com o mandato de quem Daniel Iliescu dá essas declarações?

O fato de ser presidente da UNE não lhe dá o direito de decidir unilateralmente sobre coisas que, ele mesmo admite na mesma entrevista, nem sequer foram discutidas: “Até aqui não surgiu nenhuma opinião de um militante ou de um dirigente da UNE que levasse a uma moção de desagravo, por exemplo. O que não impede que, numa próxima reunião da entidade, alguma pessoa proponha algo nesse sentido”.

E muito menos lhe dá  direito de negar a história da entidade.

Em 1992 Collor foi derrubado nas ruas e o mesmo STF, calado, só em 1994 decidiu absolver Collor “por falta de provas”. Será que Daniel Iliescu pensa que caberia à UNE naquela época “a responsabilidade de respeitar as instituições democráticas?”

A história mostrou que não e que a UNE e o povo brasileiro foram às ruas contra o silêncio e depois a decisão do STF derrubar Fernando Collor.

Afinal de contas, essa “instituição democrática” que Daniel Iliescu quer que a UNE respeite é o mesmo STF que avalizou todas as decisões do regime militar, mantido aberto com alguns juízes cassados para dar uma fachada democrática ao regime. É o mesmo STF que empunha a Lei da Anistia aprovada por um Congresso comprometido com o regime militar, para deixar de punir e até mesmo reconhecer criminosos do período da ditadura que torturaram e mataram centenas de lideranças estudantis, incluindo um presidente da UNE, Honestino Guimarães.

Este é o mesmo STF que se recusa a julgar a Lei das Organizações Sociais que privatiza os serviços públicos, questionada em 1998 pelo PT. Assim como liberta banqueiros e especuladores criminosos como Daniel Dantas e não julgou o mensalão mineiro e muito menos a privataria tucana que vendeu a preço de banana várias empresas estatais  como a Cia. Vale do Rio Doce.

Não “respeitar” o STF. Foi isso que fez a UNE para derrubar Collor! E terá que ser assim para varrer os entulhos da ditadura que sobrevivem e punir os assassinos e criminosos impunes pela perseguição, tortura e morte de tantos que combateram pela democracia no país! É o que o povo fará, mais cedo ou mais tarde.

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Dirceu e Genoino foram condenados num julgamento que dispensou provas concretas, feito com base em presunções e denuncias, pressionado pela mídia, como explicam numerosos estudiosos de direito. Um ataque contra o Estado de Direito e principalmente contra o PT e sua base social, desferido diretamente pelo STF, num julgamento de exceção que preserva a regra: o sistema político eleitoral, marcado pelo caixa dois, pela corrupção e o tráfico de influência.

Sem provas, só quem deveria poder julgar os dois pela política que desenvolveram são os militantes do PT e no limite, o povo. Mas o presidente da UNE pretende já ter definido a posição da entidade: “a UNE reconhece esse poder e tem a responsabilidade de respeitar as instituições democráticas”. Resta saber, com o mandato de quem? Dos estudantes ou de seu partido?

O próprio Daniel Iliescu fez uma observação correta nessa entrevista: “Eu acredito sinceramente que os crimes que foram identificados e que vão ser agora punidos pelo STF, nesse episódio que se convencionou chamar de mensalão, não é exceção no Brasil. Ele é um episódio de uma prática que é recorrente, que é praticada, eu não diria por todos, porque seria leviano da minha parte, mas por uma boa parte dos partidos políticos, tanto de esquerda quanto de direita, tanto do governo ou de oposição. Então é uma prática recorrente que se utiliza para financiar a atividade política, formar maiorias, financiar campanhas.”

Correto. Afinal, de fato, esse não é um episodio isolado. O Julgamento é que é. Só não tirou a conclusão necessária. Esse é um problema das instituições no Brasil, instituições que precisam ser passadas a limpo. Como solução, o presidente da UNE aponta uma “reforma política”. Mas quem fará essa reforma política? O próprio congresso que precisa ser reformado, onde impera a lógica do “balcão de negócios”? Pouco crível. É preciso que o povo brasileiro decida soberanamente as suas demandas e reivindicações, o que só será possível com uma Assembleia Constituinte Soberana.

À UNE e a qualquer um que defenda a democracia cabe denunciar o ataque ao PT e sua base social. É um preâmbulo de um ataque aos movimentos sociais e aos sindicatos. Ataque que certamente não deixará a própria UNE de fora.

Luã Cupolillo, é membro do Conselho Nacional da Juventude Revolução