Um curso sionista oferecido pela UFJF?

Convidado pelo PPG de Ciências da Religião, o professor de filosofia Gérard Bensussan iniciou um curso na UFJF sobre “Sionismo e antissionismo como história judaica”. O tema é de interesse no contexto atual, onde o estado sionista de Israel destruiu todas as universidades palestinas, assassinou 42 mil pessoas, destruiu mais de 400 mil casas total ou parcialmente e comprometeu toda a infraestrutura médica em Gaza. O professor escolhido pra ministrar o curso, porém, é de alarmar qualquer estudante que se solidarize com a população palestina duramente massacrada nos últimos 200 dias.

Em 2014, Israel iniciou um massacre contra a população palestina que durou 50 dias. Apontado pela mídia como uma guerra entre “Israel e Hamas”, mais de 2000 palestinos foram mortos, a maioria civis. Na ocasião, Bensussan tomou as dores do estado israelense corretamente denunciado por filósofos como Alain Badiou e Cécile Winter, tentando colocar neles a pecha de antissemitas [1].

Alain Badiou, de origem política diversa da nossa, em “Usos da palavra ‘Judeu’” explica que muito do discurso consensuado sobre o Estado de Israel se apoiava no fenômeno do Holocausto pra isentar Israel de toda responsabilidade pelo massacre da população palestina. Complementa dizendo que “é intolerável ser acusado de anti-semitismo pelo único motivo de [não concluir que] as demandas israelenses, cuja natureza colonial é patente e banal, sejam toleradas” e explica, ainda, que a concepção política sionista, baseada em uma excepcionalidade do povo Judeu, leva ao desastre. Em “A palavra ‘Judeu’ e os bajuladores”, Badiou argumenta que o sionismo, enquanto política baseada na excepcionalidade de uma identidade, “espera erradicar pra sempre a possibilidade do universalismo político, […] de uma política praticada pelas pessoas que estão aqui, independentemente da sua origem”. [2]

Essas são as posições, absolutamente legítimas, que Bensussan, desesperado por defender o estado de Israel, buscou considerar antissemitas. Ele tentava argumentar que o pensamento de Badiou seria suficiente pra fazer uma ressurgência do antissemitismo na França, fortalecendo a extrema-direita. Ou seja, na concepção do “louvável” professor convidado, a verdadeira luta contra o antissemitismo da extrema direita passa pela defesa do imperialismo e do sionismo.

Quem dera essas fossem posições só no passado. A realidade é que Bensussan segue fazendo malabarismos teóricos de todo tipo pra justificar sua adesão ao Estado de Israel. Em artigos recentes no jornal sionista “A regra do jogo”, o autor defendeu que o antissionismo de esquerda é uma simples reedição de teorias antissemitas do catolicismo, e mais recentemente (7 de Abril) afirmou que ações como a do Tribunal Internacional Penal criam uma “nazificação dos judeus” (ou seja, não é o genocídio, mas a denúncia dele, que deve ser combatido). [3]

Há antissemitismo na esquerda, é verdade e deve ser combatido. Mas a posição do professor convidado não se preocupa em fazer essa diferenciação; joga na vala comum do antissemitismo qualquer não-judeu que conteste a existência do Estado de Israel, produto da ação imperialista no oriente médio, e que defenda um só Estado democrático na Palestina.

O fato que o sionismo tenta encobrir é que a ocupação criminosa do território palestino, da Nakba ao genocídio atual, busca a limpeza étnica da região. É vergonhoso que seja esse o ponto de vista adotado pelo departamento de Ciências da Religião da UFJF. Num momento onde os estudantes americanos que ocupam suas universidades contra o financiamento do genocídio do povo palestino (em Columbia, Yale, Havard e outras) dão o exemplo, não podemos coadunar com discursos colonialistas e racistas.

Defendemos que a UFJF adote uma posição firme em defesa do povo palestino, propondo inclusive a ruptura das relações acadêmicas, econômicas e militares das universidades brasileiras com Israel. Defendemos, ainda, que discursos racistas como o sionismo não tenham espaço em nossa universidade!

[1] https://wayback-api.archive.org/web/20140726/https://www.liberation.fr/politiques/2014/07/22/l-extreme-droite-en-a-reve-l-extreme-gauche-l-a-fait_1068401/
[2] https://www.lacan.com/badword.htm
[3] https://laregledujeu.org/2024/04/07/40203/antisionisme-de-la-chaire-sionisme-antisionisme-antisemitisme/

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